A iniciativa do presidente da Argentina, Javier Milei, ao promover o lançamento de uma criptomoeda por uma empresa privada desencadeou uma nova crise polĂtica no paĂs, forçando-o a anunciar uma investigação contra si mesmo.
O episódio que parte da imprensa argentina está tratando como o “cripto gate” envolve a suspeita de funcionários do governo federal, incluindo o próprio presidente, em supostas irregularidades envolvendo a criação da $Libra, uma criptomoeda que, segundo Milei, ajudaria a financiar pequenas empresas e empreendimentos argentinos.
As crĂticas e as reações Ă iniciativa de Milei se avolumaram depois que o presidente argentino publicou, nas redes sociais, um texto de apoio ao projeto Viva La Libertad, que Ă© encabeçado pelo lançamento da $Libra.
Assim que o presidente tornou pĂşblico seu apoio Ă iniciativa, o valor do ativo digital disparou, valorizando-se exponencialmente. Os poucos detentores da criptomoeda começaram entĂŁo a vendĂŞ-la, com lucros altĂssimos. PorĂ©m, o valor da $Libra voltou a cair tĂŁo logo especialistas e oposicionistas a Milei começaram a apontar o risco de fraude no empreendimento.
A primeira reação do presidente argentino foi apagar a publicação promocional de sua conta no X (antigo Twitter), substituindo-a por uma nova mensagem na qual afirmava nĂŁo ter nenhum vĂnculo com o “suposto empreendimento privado”, do qual nĂŁo conhecia os “pormenores”.
O esclarecimento nĂŁo conteve a escalada da crise, a ponto do jornal La Nacion, um dos mais influentes do paĂs, noticiar que o “escândalo $Libra abriu uma caixa de pandora”, com acusações de que pessoas prĂłximas a Milei teriam pedido vantagens pessoais a empresários em troca de franquear o acesso ao presidente argentino.
Pressionado, o governo argentino anunciou duas medidas. Em uma nota oficial divulgada neste sábado (15), a equipe de Milei informou que o presidente determinou ao Gabinete Anticorrupção que apure se algum membro do governo nacional, incluindo ele mesmo, agiu de forma imprópria. Além disso, Milei informou que será criada, no âmbito da própria presidência, uma força-tarefa composta por representantes de vários órgãos e organizações interessadas no tema para que avaliem o projeto Viva La Libertad, a $Libra e todas as empresas ou pessoas envolvidas com a iniciativa.
Ainda na nota, a equipe de Milei esclarece que o primeiro contato do presidente com os representantes da empresa responsável pela $Libra aconteceu em 19 de outubro de 2024, durante um encontro no qual os empresários comentaram a intenção de “desenvolver um projeto para financiar empreendimentos privados na Argentina utilizando tecnologia blockchain”. O encontro, público, foi devidamente registrado na agenda de Milei, segundo sua equipe.
Cerca de dois meses e meio depois, em 30 de janeiro deste ano, por sugestão dos mesmos empresários, Milei se reuniu com o sócio do empreendimento que forneceria toda a infraestrutura tecnológica necessária.
“Finalmente, nesta sexta-feira, o presidente [Milei] compartilhou uma publicação em suas contas pessoais comunicando o lançamento do projeto, tal como faz cotidianamente em relação a muitos empreendedores que querem lançar um projeto para criar empregos e investir na Argentina”, acrescenta, na nota, a equipe do chefe do executivo da Argentina, reafirmando que ele não participou da criação e do desenvolvimento da criptomoeda.
“Frente as repercussões [negativas] que o anúncio do projeto gerou, para evitar qualquer especulação e para não dar mais publicidade [à iniciativa], [o presidente argentino] decidiu eliminar a publicação [de sua conta pessoal no X]”, finaliza a equipe presidencial, garantindo que todas as informações sobre o assunto que forem reunidas pelo Gabinete Anticorrupção e pela força-tarefa que será criada serão encaminhadas à Justiça, “para que esta determine se alguma empresa ou pessoa vinculada ao projeto cometeu algum delito”.
Na manhĂŁ deste domingo, representantes de duas organizações sociais (ObservatĂłrio do Direito Ă Cidade e Movimento A Cidade Somos NĂłs Que A Habitamos) e de um partido polĂtico (Unidade Popular) ingressaram na Justiça com uma denĂşncia contra o presidente argentino, a quem acusam de ter prejudicado a mais de 40 mil pessoas ao se associar a um esquema que, segundo os denunciantes, teriam causado um prejuĂzo da ordem de US$ 4 bi.